Ora bem, ora bem, ora bem. Acometidos por um acesso de masoquismo, eis que os Tios Dolce e Bichana foram fazer uma prospeção pelos blogs de poesia que pululam por essa Net. E, de entre as muitas pérolas encontradas, descobrimos uma auto-proclamada Pérola, que deu ao seu recanto o nome de "
E era tudo muito bom."
Era, perguntamos nós? E já não é? Ou "seria" (hipoteticamente), mas nunca "será" (realmente)? Bem, ignoremos esta ligeira ambiguidade verbal, pois já deu para perceber que a querida autora deste blog já está muuuuito avançada nos entas, escrevendo de memória ou sob influência de alucinações alzheimerianas.
Comecemos. O tema do poema é o desejo sexual, como se pode ver pelo título ("Cobiço-te") e pela imagem tão subtil que a Pérola amorosa escolheu para o ilustrar. Muito bem, que ousadia de tópico! Já estamos a ver que a senhora é uma grande marota, ai já já. É claro que não há assunto mais perigoso e difícil de abordar sem cair no ridículo, mas a Perolazinha não se apoquenta e lança-se na primeira estrofe:
Cobiço-te
o ímpeto inesperado
de
apetites gulosos.
Espere lá, espere lá, que começamos bem!... Então por que motivo é que o ímpeto dele é inesperado? O homem já não dava sinal de vida há muito tempo, era, sua querida? Ah, assim já percebemos melhor a sua imensa alegria por este acontecimento.
Cobiço-te
as ondulações gemidas
do corpo
firme que serpenteia.
Fazendo um duro esforço hermenêutico, lá conseguimos perceber que o corpo do amante que esta fofa arranjou ondula, geme e serpenteia. Credo, será Parkinson? Tenha cuidado, sua querida, que conhecemos muitos casos de AVCs e ataques cardíacos ocorridos durante o coito. Em matéria de cama, convém não arriscar e evitar os utentes frequentes do SNS.
Cobiço-te
os beijos incontáveis
de boca
sofrêga [sic] em humidade saborosa.
Ó rica, se é saborosa a sua humidade ou não cabe a ele decidir, não acha? (Os nossos estimados leitores que nos desculpem esta ligeira quebra no elevado nível da nossa prosa, mas a culpa é da Pérola, que nos provocou.)
Cobiço-te
as ausências adivinhadas,
presentes
orgásticos e sonhos desregradamente ousados.
Como diz?... "Ausências adivinhadas"? Então o homem ainda agora deu um ar da sua graça e já se vai ausentar? E os "presentes orgásticos" estão quase-quase, vai-que-não-vai, a transformar-se em "sonhos ousados"? Por outras palavras, a realidade está prestes a tornar-se ficção? Ora bolas! É caso para dizer que foi sol de pouca dura.
Cobiço-te
o vulcão saciado
em erupção
de prazer desmesurado.
"Vulcão saciado" - olha, uma metáfora! Parabéns (considering...)! Mas olhe que, na idade dele, um vulcão saciado leva o seu tempo a recuperar. E cheira-nos que o prazer dele foi tão, mas tão "desmesurado" que o homem foi tirar umas férias para a Martinica.
Contente com o belíssimo poema que lavrou, a Pérola decide terminá-lo com o seguinte verso singelo:
Cobiço-te
. . . porque me apeteces !
Sabe o que se chama a isto? Redundância. Truismo. E anti-clímax, tout court. Então a querida alega que foi à Lua e voltou, colhendo todas as estrelas pelo caminho, e tudo o que lhe ocorre dizer no final é que ele lhe apetece? Olhe, a nós apetece-nos ir ali comer um gelado. E ir lá fora ver se chove.
Oiça uma coisa que lhe vamos dizer, sua amorosa poetisa wannabe: quem não tem unhas não toca viola. E quem mistura orgasmos, humidades, gemidos, prazeres, firmezas, suores e o diabo a quatro, tudo num único verso, está a pedi-las, não acha? O que nós lhe pedimos a si, sua jóia, é: give us a break. O firmamento dos poetas agradece.
Sempre vossos,
Dolce e Bichana